Introdução
O diagnóstico ecográfico das malformações fetais ou de alterações cromossômicas evoluiu sobremaneira na última década. Esta evolução é fundamentada em vários aspectos como melhora na qualidade de imagem dos equipamentos de ultra-sonografia com a utilização de transdutores endocavitários de alta-frequência, maior compreensão evolutiva da embriogênese e desenvolvimento das organogênese embrio-fetal, padronização das técnicas do exame e maior experiência dos operadores na realização do exame.
Na década de 90 introduz-se o “rastreamento biofísico”, inicialmente realizado no ultra-som morfológico entre 18-24 semanas, exame este que em associação com a idade materna procura identificar alterações anatômicas no feto que possam estar associadas à alterações cromossômicas como trissomia 21, 18 e 13, mas também identificar possíveis anomalias anatômicas classificados como marcadores maiores ex: defeito do septo atrio-ventricular ou sinais específicos também conhecidos como marcadores menores ex: foco ecogênico.
O Prof. Kypros Nicolaides na década passada postulou que o acúmulo de fluído na região da nuca fetal (figura 1 e 2) comumente chamado de translucência nucal (TN) está associado a um aumento do risco para identificação das trissomias 21, 13 e 18. Cerca de 80% dos fetos com aneuploidias tem a medida da TN aumentada (acima do percentil 95°), porém estes achados associados a 5% (falso positivo) de fetos com cariótipo normal (Snijiders, 1998). O entendimento da organogênese fetal neste período da gestação nos trouxe uma nova realidade, o diagnóstico no primeiro trimestre de malformações anatômicas, que podem ser isoladas ou associadas à aneuploidias e/ou síndromes genéticas.
Recomendamos que o ultra-som morfológico de primeiro trimestre seja encarado como um exame muito importante, pois nesta fase da gestação a qualidade das imagens é muito boa pois utilizamos preferencialmente a via transvaginal com transdutores de alta frequência, bem como a avaliação sistematizada dos orgãos fetais, com a possibilidade de diagnósticos (tabela-1) antes somente realizados no segundo trimestre.
A utilização do Ducto Venoso (DV) vem sendo estudada desde 1996 principalmente pelo grupo do Prof. Dr. Nuno Montenegro (Portugal) e é um método bastante importante nos fetos com TN aumentada para identificação de anomalias cromossômicas e cardiopatias congênitas. A medida da TN acima do percentil 95° e DV com onda A ausente ou reversa (figura 3) está associada à cardiopatias graves e resultados perinatais adversos. Porém os trabalhos mais recentes ainda relatam que não existe um valor significativo nos casos com TN normal e DV anormal.
O osso nasal (figura 4) é o mais novo modismo, porém devemos ter cuidado pois é exige cuidado na obtenção de cortes adequados para sua avaliação, e não tem correlaão com os valores das medidas da TN, portanto sendo importante definir se o osso nasal está presente, ausente ou hipoplasico. Na trissomia 21 cerca de 70-75% dos casos apresentam osso nasal ausente ou hipoplasico, sendo um marcador isolado.
Como realizar o exame entre 11-14 semanas?
Via de acesso: via abdominal ou transvaginal (preferencial)
É poca do exame: entre 11 e 13 semanas e 6 dias ou quando o Comprimento-Cabeça-Nádegas (CCN) estiver entre 45-85mm.
Considerações sobre o exame: O exame é um estudo morfológico no primeiro trimestre (vide tabela-1), onde faz-se uma avaliação minuciosa da anatomia fetal, incluindo-se também o mapeamento o estudo funcional circulatório fetal (Doppler artéria umbilical, Ducto venoso e Válvula Tricúspide). Neste momento estudamos o colo uterino (comprimento do colo uterino e sinais de dilatação), e também a avaliação das artérias uterinas.
Deve-se ter em mente que este exame é um estudo complexo da anatomia e fisiologia fetal, que tem como finalidade o rastreamento de aneuploidias e malformações fetais de forma precoce. Após o estudo ecográfico conversamos com o casal e informamos os riscos estatísticos de associação com aneuploidias e como prosseguir com o acompanhamento ecográfico durante a gestação.
Cortes Padronizados no estudo anatômico no primeiro trimestre
Discussão
Como sabemos o aumento da medida da TN acima do percentil 95° está associado à anomalias cromossômicas (trissomia 21, 13 e 18), mas também com aumento da mortalidade perinatal, associação com cardiopatias congênitas, outras malformações anatômicas, sindromes genéticas e infecções congênitas.
Devemos considerar alguns aspectos éticos que devem ser aplicados no rastreamento do primeiro trimestre. Este exame é realizado em filhos muito desejados e esperados e aguardado como saudáveis, porém observamos ao longo destes quase dez anos realizando o rastreamento no primeiro trimestre, especialmente com a introdução da medida da translucência nucal uma dificuldade muito grande na compreensão do casal e do médido solicitante na interpretação dos resultados do exame.
O rastreamento realizado no primeiro trimestre é considerado um rastreamento complexo pois envolve uma série de variáveis tanto maternas (ex. idade) e do ambiente fetal (ex. CCN, TN, cardiopatias congênitas, gestação múltipla), todos estes dados são analisados para estabelecer-mos um risco estatístico para associação com aneuploidias.
Nosso papel como médicos que realizam exames complementares é o de promover ao casal e médico assistente, o aconselhamento morfo-genético que deve ser não diretivo, imparcial, conter informações sobre riscos estatísticos (ex: risco para trissomia 21 de 1em 450), e estar sempre respaldado em dados publicados na literatura. Mesmo tomando todos estes cuidados à compreensão e expectativa da paciente ou casal pode tomar rumos que não desejamos, como aumento da ansiedade e até mesmo negação de nóticias adversas.
O presente e futuro é a realização do diagnóstico precoce das aneuploidias e malformações fetais, especialmente entre 11-14 semanas, mas para isso devemos estar muiot bem preparados não só para o diagnóstico mas também sabermos lidar com os resultados deste processo de rastreamento.